Poupado de críticas por Deltan Dallagnol, Bolsonaro calou sobre cassação e exibiu abandono político de ex-procurador

Poupado de críticas pelo ex-procurador Deltan Dallagnol (Podemos-PR) durante o programa Roda Viva, da TV Cultura, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não demonstrou preocupação com a cassação do deputado federal e não se manifestou publicamente contra a decisão Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Além disso, o ex-presidente pediu a aliados que não comparecessem a um ato organizado pelo Movimento Brasil Livre (MBL) em defesa do ex-procurador, na última semana.

Desvisada da recomendação, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) chegou a publicar nas redes um convite. Em seguida, voltou atrás sob a justificativa de que não havia falado com o ex-presidente antes de fazer a postagem. Na última quinta-feira, em encontro com presidentes estaduais e regionais do PL o ex-presidente justificou, de forma indireta:

— Essa CPMI (do dia 8 de janeiro) é muito importante para nós. Mais que qualquer movimento que porventura alguém queira fazer. Eu até peço: não faça. O movimento mais importante nosso no momento é a CPMI. Estou vendo algumas pessoas perdidas, querendo marcar amanhã com o povo na rua… peço: não faça — declarou.

Desde a cassação de Dallagnol, parlamentares da sigla criticaram a decisão do TSE e promoveram movimentos de revolta nas redes. Na coletiva de imprensa dada no dia seguinte à decisão, expoentes do bolsonarismo, como Eduardo Bolsonaro (SP) e Júlia Zanatta (SC), estavam ao lado do deputado.

Internamente, no entanto, esta minoria barulhenta não chega à diretoria do partido, que não demonstra desconforto com a perda do mandato do ex-procurador. Ao contrário, o ganho de mais uma cadeira para a bancada é visto com bons olhos: no lugar de Dallagnol, o pastor Itamar Paim (PL-PR) assumeá a cadeira, fazendo com que a sigla tenha cem representantes.

Como antecipou Bela Megale , esta minoria chegou a pedir a Altineu Côrtes, liderança do partido na Câmara, que o PL liderasse uma escuta das pautas da Casa como uma reação à cassação, o que foi negado. A decisão em não atender a ala bolsonarista tem, entre os seus principais motivos, fazer um aceno ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do TSE, Alexandre de Moraes.

Ação contra Moro
Enquanto Dallagnol enfrenta questões com a Justiça Eleitoral, o PL encabeça uma ação contra seu maior aliado político, o senador e ex-juiz federal da Lava-Jato Sergio Moro . A sigla o acusa de abuso de poder econômico e caixa dois durante o pleito do ano passado.

Nos autos do processo, a alegação é de que o ex-juiz tentou driblar a legislação eleitoral em dois movimentos: na resistência em concorrer ao Palácio do Planalto que teria o levado a exceder o gasto limite de campanha e na migração partidária do Podemos para o União Brasil.

Fontes próximas à cúpula do PL apontam que o ex-juiz chegou a procurar Bolsonaro, após a cassação do amigo, na expectativa de que o partido retirasse a ação. No entanto, a decisão final da sigla é por manter o processo que pode colocar em xeque o mandato de Moro.

Histórico de críticas
A rachadura entre o bolsonarismo e o lava-jatismo não começou há duas semanas, com a cassação de Dallagnol. Apesar de terem tido origem no mesmo momento político brasileiro, durante as crises do governo Dilma (PT), o primeiro distanciamento ocorreu em 2020, quando Sergio Moro deixou o Ministério da Justiça. Os filhos do ex-presidente fizeram uma série de comunicações com o ex-ministro de “traidor” e “ingrato”.

Nesta mesma época, o ex-juiz e Deltan Dallagnol também passou a criticar o governo de Bolsonaro. O ex-procurador chegou a dizer que a pauta da anticorrupção, apresentar no palanque eleitoral de 2018, teria sido apenas uma “estratégia de campanha”.

No final de 2021, os dois gravaram vídeos trocando melodias. Na ocasião, o ex-presidente acusou o deputado de “tráfico de influência”. De acordo com Bolsonaro, Dallagnol teria o procurado para tentar ser indicado à Procuradoria-Geral da República e ainda tentado usar a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro como via para o cargo.

O GLOBO

Postado em 5 de junho de 2023