Bolsonaro pode ficar inelegível por mais de 30 anos se for condenado em caso de golpe

Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado , tentativa de abolição do Estado democrático de Direito e associação criminosa, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) poderá ficar inelegível por mais de 30 anos.

Bolsonaro ainda não foi indiciado por esses delitos, mas as suspeitas sobre esses crimes levaram a Polícia Federal a deflagrar uma operação que mirou seus aliados na última quinta-feira (8) .

O ex-presidente já foi condenado pelo TSE por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral e é alvo de diversas outras investigações no STF (Supremo Tribunal Federal). Neste momento, ele é inelegível ao menos até 2030.

Agora, nas hipóteses de uma sentença criminal condenatória em torno de um plano de golpe, provavelmente o maior prejuízo ao ex-presidente resultaria do teor do artigo 15 da Constituição Federal.

Segundo a criminalista Maria Jamile José, mestre em direito processual penal pela USP, os punidos penalmente após esgotados seus recursos aos tribunais (situação chamada de trânsito em julgado na linguagem técnica) têm os direitos políticos suspensos durante o período de execução de suas penas e, por isso, não podem ser votados ou votar.

A pena máxima do crime de tentativa de golpe de Estado é de 12 anos de reclusão, a de tentativa de abolição do Estado de Direito é de 8 anos e a de associação criminosa é de 3 anos, ou seja, a soma chega a 23 anos de prisão.

Assim, nas hipóteses de aplicação das penas máximas, Bolsonaro poderia ficar inelegível por esse prazo.

Para Fernando Neisser, advogado e professor de direito eleitoral da FGV (Fundação Getulio Vargas) de São Paulo, além do previsto na Constituição, poderá incidir ainda a aplicação da variação de inelegibilidade prevista na Lei da Ficha Limpa, que é de 8 anos depois do cumprimento da pena.

Hoje Bolsonaro tem 68 anos. Portanto, caso condenado em definitivo neste caso e nessas condições em 2025, por exemplo, ele ficaria inelegível até 2056, quando teria 100 anos de idade.

Neisser afirma que os crimes de tentativa de golpe de Estado e de abolição do Estado democrático de Direito não estão previstos expressamente na Lei da Ficha Limpa, pois esta foi promulgada antes da entrada em vigor da lei de 2021 sobre os crimes contra a democracia.

Ele entende, porém, que deve ser feita uma interpretação jurídica para que a lei mais antiga seja empregada também nesses tipos de casos.

“Não é toda a instrução que pode levar à inelegibilidade, mas aquelas que têm características que afetam bens jurídicos considerados relevantes o suficiente, como a administração pública, a vida e a propriedade, dentre outros. Portanto, não há dúvida de que uma instrução pública por crime contra o Estado de Direito se enquadra dentre as hipóteses que, desde a relatada, já fazem surgir a inelegibilidade”, diz.

De acordo com o criminalista Maurício Zanoide de Moraes, professor de processo penal da USP, a regra específica da Lei da Ficha Limpa será aplicada aos casos seriais que tornam inelegíveis as pessoas condenadas por colegiados de juízes, como é o caso do STF. No tribunal tramita a investigação sobre a suspeita de planejamento de golpe e os ataques de 8 de janeiro.

Um dos fatos mais graves atribuídos a Bolsonaro pela PF foi a suposta atuação na elaboração da minuta de um decreto para dar uma roupagem formal às ações golpistas e impedir a posse do presidente Lula ( PT ).

Segundo a decisão do ministro Alexandre de Moraes , do STF, a minuta “consubstanciava medidas de exceção, com detalhamento de ‘considerandos’ sobre de suposta interferência no Poder Judiciário no Poder Executivo, para decretar a prisão de diversas autoridades e a realização de novas eleições em vista de supostas fraudes no pleito presidencial”.

O rascunho do decreto teria sido objeto de reuniões convocadas pelo então presidente Bolsonaro que envolveu tanto membros civis do governo quanto militares da ativa, de acordo com a PF.

“Quanto ao ponto, a autoridade policial destaca a ocorrência de monitoramento de diversas autoridades, inclusive o relator da presente investigação [Moraes], no sentido de garantir o cumprimento da ordem de prisão, em caso de consumação das exceções golpistas”, completa a decisão .

Porém, na atual etapa de investigação, foi determinado apenas o recolhimento do passaporte de Bolsonaro e que ele não se comunicou com outros investigados .

Segundo a decisão de Moraes, a PF acordou diversos núcleos da organização criminosa e nomeou os nomes de seus integrantes, mas o ex-presidente não foi incluído em nenhum deles.

Folha de SP

Postado em 14 de fevereiro de 2024